Somos mecânicos ou vendedores de peça?

Somos mecânicos ou vendedores de peça

Por: Fábio Moraes

Participo de alguns grupos de oficinas no Whatsapp e tenho acompanhado algumas discussões “acaloradas” sobre a relação venda de mão de obra e de peças.

Existem vídeos no Youtube, postados nestes grupos de oficinas de pessoas falando firmemente que o dono do carro deve levar a peça para ser trocada e a oficina somente aplicar esta peça fornecida pelo cliente, ou seja, a oficina ganha somente na venda do serviço.

Neste sentido resolvi ponderar sobre tudo o que tenho escutado e gostaria de levar cada um a refletir, somente com a razão, sobre este assunto.

Somos mecânicos?

Todos somos mecânicos, uns com mais experiência de vida profissional e outros menos. Alguns buscando seu espaço para crescer neste mercado automotivo e outros já com o nome forte, porém todos tentando encontrar seu espaço e crescer nesta crise econômica e política que o país vive.

Existe uma regra básica do negócio “oficina”, que vem de muitos anos atrás que é a compra e a aplicação da peça pela oficina. Aos poucos este formato foi evoluindo e a relação de confiança entre a oficina e o dono do carro também foi evoluindo.

Por muitos anos o dono do carro entrava numa oficina e deixava a chave com total confiança naquilo que escutava em relação aos serviços que deveriam ser executados e as peças que deveriam ser trocadas. A preocupação com o valor final do orçamento era importante, mas nesta época não era o primeiro item de avaliação do proprietário do carro.

Como a tecnologia ainda não era tão forte quanto nos dias de hoje a oficina comprava a peça da loja de autopeças ou de um distribuidor e encaminhava os serviços.

O tempo passou, a tecnologia evoluiu e o perfil de cliente mudou muito. Atualmente o cliente está muito exigente e quer saber quanto vai ficar o conserto do carro, mesmo antes dele ser consertado.

Nesta mudança de perfil alguns clientes já estão conversando com as oficinas para ele comprar as peças e fornecer para os reparos. Conheço oficinas que aceitam e conheço as que não aceitam. Quem está certo? Tem alguém errado?

Prefiro responder que nunca vamos ter alguém certo ou errado nesta relação, se analisarmos friamente a mudança de comportamento dos clientes, porém quero reforçar que sem controles gerenciais e sem um acompanhamento diário do proprietário da oficina analisando os indicadores, nenhuma das opções vai dar resultado.

Tão importante quanto isso é lembrarmos que cada região e cada cidade é diferente e o perfil dos clientes também é diferente. Não podemos comparar um cliente de uma cidade do interior, onde tudo é mais próximo inclusive as relações pessoais, com os clientes de uma capital.

Não podemos simplesmente “cravar” que uma oficina depende da venda de peças para sobreviver, porque muitas vezes o valor de mão de obra, baseado na região da cidade onde está localizada minha oficina, permite que o valor cobrado seja mais caro do que em outras regiões da mesma cidade. Agora imaginem quando falamos do país?

Somos vendedores de peças?

Compramos as peças para aplicação porque na grande maioria das vezes temos um conhecimento que o dono do carro não tem. Compramos as peças porque quando sabemos a origem delas podemos dar garantia da peça trocada e do serviço executado. Compramos as peças, porque acostumamos incluir em nosso faturamento os valores das peças.

Compramos as peças porque elas fazem parte do nosso negócio e são uma oportunidade de ganharmos dinheiro. Compramos as peças porque elas são parte integrante do negócio chamado oficina e em momento algum isso diminui a profissão “mecânico”. Comprar peças para aplicar no carro ou ainda ter um pequeno estoque de peças de giro agiliza o processo do atendimento ao cliente.

Portanto “mecânicos” não se sintam inferiores ou menos importantes porque vocês vendem peças. No Brasil as oficinas trabalham, nos dias de hoje, com o faturamento dividido entre 65% de peças e 35% de mão de obra, na média.

Somos mecânicos e somos vendedores de peças:

  1. Atualmente pouquíssimas oficinas trabalham somente com a venda de serviços (mão de obra). Para que isso aconteça é fundamental trabalhar todos os indicadores da oficina e entender o que cada um quer dizer. Mais do que isso, é necessário entender a região onde a oficina está e saber até onde esta região absorve um aumento nos valores de mão de obra.
  2. A tecnologia está empurrando “goela abaixo” uma mudança nesta relação, através de sites como o Mercado Livre, canais do Youtube, entre outros. Nós não podemos ficar para trás e também temos que “caminhar” com esta tecnologia. A sugestão é conversarmos com as associações e sindicatos da categoria ou ainda com pessoas que trabalham com o segmento das mídias sociais (Jornal Oficina Brasil, Ultracar, entre outros), para buscar orientações.
  3. Precisamos ser mecânicos e vendedores, porque não podemos comparar uma oficina pequena que precisa da composição da venda de peças e da mão de obra para sobreviver, com uma oficina que “nasceu” com um projeto definido de somente cobrar pela mão de obra. Neste ponto também temos que levar em consideração as ferramentas, equipamentos, parcerias com fornecedores, entre outros que esta oficina possui e que permitem que ela cobre um valor maior de mão de obra.
  4. Existem oficinas que não sabem cobrar a mão de obra e isto é uma verdade. Existem oficinas que se não agregarem as peças com vendas no orçamento vão fechar, isto também é verdade. Mas não podemos generalizar, pois no mercado de mais de 100 mil oficinas no Brasil muitas conseguem trabalhar um bom valor de mão de obra e algumas aprenderam a trabalhar sem a venda de peças. Importante é sabermos que não existe uma única verdade ou ainda que temos um certo e um errado. O que existe são perfis diferentes das oficinas e que estes perfis fazem toda a diferença na hora que o proprietário vai fazer a composição do valor que ele vai cobrar pelas peças e pelos serviços.
  5. Por fim nada do que está escrito acima funcionará se a oficina não possuir os controles gerenciais necessários para acompanhar os indicadores financeiros, operacionais e produtivos.  Nada vai funcionar se a sua oficina não possuir um bom sistema de gestão e se seus funcionários não estiverem bem preparados para alimentar corretamente as informações neste sistema e, principalmente, nada vai funcionar se você, proprietário da oficina, não decidir mudar sua forma de administrar. E aqui é o mais difícil, porque muitos donos de oficinas ainda acreditam que conduzem a sua empresa corretamente e esquecem que qualquer mudança começa pelo dono.

Fábio Moraes é CEO da empresa Ultracar, com 25 anos de experiência em gestão e administração de oficinas. Matemático, Analista de sistema e Administrador de empresas. Auditor do IQA, (Instituto de Qualidade Automotiva), consultor do IAA e consultor de várias oficinas do Brasil. Está viajando o Brasil inteiro neste ano de 2017 ministrando palestra com o tema “Oficina de sucesso é oficina rentável: transformando reparadores em empresários”.

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